quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Antes de preparar as crianças para ter, é preciso ensinar a ‘ser'

Vivemos em uma sociedade competitiva, e não há mal em preparar as crianças para lidar com ela, desde que seja respeitado o maior e mais importante direito da infância: ser criança.
Quais são os limites entre a "preparação" e a "competição"? Na tentativa de preparar os pequenos para o mundo, é fácil incorrer no erro de esquecer de habilitá-las para lidar consigo próprias: os pensamentos, angústias e sentimentos individuais de cada pequeno devem vir antes das necessidades do mundo.
Por isso, cada vez mais, é preciso encontrar maneiras de preservar as crianças da "adultização precoce", da cobrança excessiva por desempenho e, principalmente, da impossibilidade de ser criança. Ou seja, antes de preparar as crianças para ter, é preciso ensiná-las a ser.
Créditos da Imagem: Shutterstock

Catraquinha conversou com a equipe pedagógica do Leiturinha, formada pelas especialistas Letícia Araújo, Fernanda Veiga e Grazieta Donato e Caroline Lara, para entender quais os impactos - do ponto de vista pedagógico - do hiperestímulo na infância. Confira a entrevista.
  • Excesso de informações x Liberdade para ser criança
Todos os dias, os pequenos recebem milhares de estímulos e informações constantes. Tarefas, cobranças, orientações, atividades. Tudo isso "preenche" o tempo das crianças. E o tempo livre para descobrir, brincar, explorar e imaginar, onde fica?
Cabe aos pais, professores e responsáveis criar espaços de silêncio e tempo livre para fazer um contraponto a essa realidade. Em casa, na escola ou onde quer que seja, a criança tem o direito de apenas ser criança.
Catraquinha - Quando estão em casa, em família, que recursos os pais podem usar para diminuir esse hiperestímulo e oferecer momentos de tranquilidade?
Leiturinha - Cultivar momentos em família pode ser uma boa oportunidade de interação e fortalecimento dos vínculos entre pais e filhos. A rotina também pode ser estruturada com respeito, de forma que necessidades individuais sejam acolhidas e elaboradas dentro de uma organização possível. E também é bem-vindo o momento do descanso, do silêncio, da descoberta dos gostos individuais. Uma boa leitura e uma boa noite de sono auxiliam em um sono restaurador.
Catraquinha - Na intenção de preparar a criança, os pais e professores podem facilmente recair em excessos e cobranças por desempenho constante, por vezes associando até mesmo o momento da brincadeira a uma situação em que a criança deve mostrar (demonstrar)  performance. Pode falar um pouco sobre isso?
Leiturinha - Há uma linha tênue que separa a "preparação" da "competição". A competição, por si só, não deve ser tomada em um sentido pejorativo, uma vez que impulsiona melhorias em  níveis coletivos e individuais. A maneira como as pessoas lidam com questões relacionadas a desempenho, sim. Há famílias e professores que tentam extrair as melhores experiências em cada situação e isso não é um problema, desde que não gere uma sobrecarga para a criança.
Se a criança consegue se sobressair em algum aspecto, é lícito que esse aspecto seja desenvolvido e estimulado, uma vez que características únicas fazem parte do nosso aparato individual. Por outro lado, o estímulo fornecido apenas em razão de uma necessidade externa ou da comparação entre pares, pode subtrair da criança a possibilidade de atuar de forma espontânea e criativa nos momentos lúdicos, como nas brincadeiras por exemplo.  Se a criança deixa de brincar e se divertir para tentar se sobressair, e isso gera um desequilíbrio em si e no grupo, é necessário intervir.
Catraquinha - A competitividade é uma cobrança muito presente na educação das crianças. Porém, o mercado de trabalho, o vestibular ou um emprego melhor teriam que ser os meios, e não os fins. Como preparar a criança para 'ser' e não para 'ter'?
Leiturinha - Para preparar crianças para ser e não ter, é necessário trabalhar com formação de caráter, de personalidade. Os  valores  éticos e  morais devem permear toda a vivência da criança, de forma que sejam construídos, vividos e lapidados nas interações sociais e familiares.
O desenvolvimento da autoestima saudável também é uma via importante de atenção ao “ser”. Uma vez que  criança  é acolhida e amada com todas as suas características e experimenta um ambiente seguro para o seu desenvolvimento, ela tem a oportunidade de desenvolver suas potencialidades e ir atrás dos seus objetivos.
Para os especialistas, quando há sentido naquilo que se faz, a ênfase é dada no “ser” e não no “ter”.
  • O valor insubstituível da imaginação
Crianças constroem sentidos e significados em tudo o que fazem. A cada atividade do dia, elas conhecem novas possibilidades de interagir com o mundo e consigo mesmas. Nesse sentido, as histórias de ficção são as chaves para novos e outros mundos, diferentes daqueles que ela já conhece.
Catraquinha - Como o mundo de fantasia e ficção proporcionado pelas histórias influencia nisso na preservação da infância?
Leiturinha - O mundo da fantasia proporciona que a criança crie uma nova experiência cheia de criatividade, sonhos e faz de conta. Ela irá inventar, vivenciar e criar o que quiser. As histórias e os contos estimulam que a criança viva o que desejar e seja quem quiser, sem se preocupar com o mundo adulto. Os próprios pais podem estimular esta vivência e brincadeiras lúdicas inventadas a partir das histórias lidas.
Catraquinha - A leitura, por ser uma atividade silenciosa e muitas vezes solitária, representaria uma alternativa aos excessos do mundo? 
Leiturinha - A leitura pode ser solitária para uns, compartilhada para outros, envolvente para muitos, tediosa para alguns.  Ela pode ser experimentada de forma individual, mas não necessariamente solitária. A leitura pode informar, emocionar, provocar sentimentos e gerar formas alternativas de entendimento, expressão e inserção no mundo.
"Conforme a criança vai crescendo, a leitura se torna mais autônoma e passa a percorrer caminhos mais individuais, mas não necessariamente solitários. Estar consigo mesmo pode ser um momento prazeroso", defende a equipe de pedagogas do Leiturinha.
Catraquinha - Como a leitura compartilhada na infância cria esse valor na criança, de valorizar os momentos consigo mesma?
Leiturinha - Dizem que quem lê, nunca está sozinho, pois há sempre um autor, uma personagem, uma história a ser escolhida, vivida e desbravada. São diversas formas de companhia e interação. Quando um  membro da família se dispõe a ter uma experiência de leitura compartilhada com  uma criança, ele está oferecendo mais do que tempo, amor e atenção. Ele está oferecendo a oportunidade de construir uma relação entre as pessoas - e entre as pessoas e os livros.
Catraquinha - Como iniciar o interesse pela leitura de forma natural, sem forçar os limites de aprendizado de cada criança e respeitando o tempo de cada uma?
Leiturinha - O exemplo é uma boa alternativa. Pais leitores normalmente estimulam o hábito de leitura nas crianças porque faz parte da rotina da casa: leem por prazer e diversão. A leitura é vivenciada como uma experiência gostosa do dia a dia, e também como possibilidade de informação, integração e troca de experiências. Possibilitar que a criança descubra seus temas de interesse e, então, oferecer a oportunidade da leitura, certamente é um bom caminho.
"Outra alternativa é incrementar a rotina com passeios a bibliotecas e livrarias, de forma que a criança possa ter uma certa autonomia para escolher e sentir as obras que mais lhes interessam."

FONTE: Catraquinha 

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

PORQUE NÃO ALFABETIZEI MEUS FILHOS ANTES DOS SETE ANOS?

Brincar com crianças não é perder tempo, é ganhá-lo; se é triste ver meninos sem escola, mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para a formação do homem.”Carlos Drummond de Andrade



crushing-kids
Tenho dois filhos. O mais velho, entrou na universidade este ano e a caçula está às vésperas de começar o ensino médio. O que me confere o distanciamento necessário para uma avaliação consciente do resultado das opções que fizemos em relação à  educação deles.
Quando o primogênito nasceu, caiu em minhas mãos um livro intitulado “Como ensinar os bebês a ler”. Como sou uma leitora contumaz, logo dei conta de conhecer o  método de alfabetização de bebês proposto nessa publicação. Confesso que fiquei chocada e ainda depois de tantos anos, me lembro da sensação desconfortante que essa leitura me causou. No final do livro, havia textos poéticos de crianças alfabetizadas em tenra idade pelo método. Eram poemas que denotavam tal densidade, tamanha angústia nas entrelinhas, uma visão cinzenta do mundo, que me assustou e me fez perceber quão nefasta é a alfabetização precoce na vida de uma criança. E logo entendi a verdadeira linguagem da criança pequena, e a forma como ela apreende e aprende o mundo. Quando o meu olhar e do meu bebê se encontravam, e um sorriso iluminado se abria em seu rostinho, com sons e aquele balbuciar característico dos bebês, ficou claro para mim que o ser humano é um ser brincante e que seu desenvolvimento e aprendizado está fundamentado numa linguagem lúdica.
Lembro também da minha irmã caçula, mais nova que eu 17 anos. Ela foi uma criança tão brincante! Levava tão a sério seu ofício de brincar! Passava horas e horas concentrada, criando brincadeiras, construindo seus brinquedos. Quando chegou a hora de ir para o 1º ano escolar e ser alfabetizada, seu desejo por brincar ainda era tão gritante, que minha mãe, em sua sabedoria foi até a escola e pediu para a diretora deixá-la  mais um ano na pré-escola. E assim foi que feliz da vida ela pôde amadurecer e se preparar para a alfabetização no ano seguinte, sem prejuízo algum à sua vida escolar.
Brincar importa
Foi observando o quanto as crianças precisam correr, pular, rolar, rodar, rir, e o quanto elas são curiosas, ávidas a explorar tudo que as cercam, que tive a certeza de que para meus filhos se desenvolverem de forma natural e saudável, o melhor a fazer seria favorecer o brincar. E desta forma optei por uma pré-escola com foco no brincar livre na natureza. O início do processo de alfabetização de ambos, só ocorreu a partir dos 7 anos, quando eles estavam prontos e maduros para as atividades intelectuais.
A natureza é uma grande mestra e criança aprende brincando. O brincar é uma atividade espontânea e nata em toda criança. O brincar ensina tudo o que os pequenos precisam aprender. Paulo Freire diz: “Primeiro a criança lê o mundo para depois ler as letras.” No contato com a natureza a criança aprende o que não pode ser ensinado nem pelos pais, nem por professores. A necessidade da criança de movimento é imensa e constante, isto a leva a conhecer e explorar o mundo que a cerca.  As vivências e brincadeiras ao ar livre proporcionam  inúmeras conquistas:
-Autonomia e segurança
-Conhecimento do próprio corpo,
-Habilidades motoras, destreza e equilíbrio corporal
-Florescimento da imaginação e fantasia
-Interesse e encantamento pelo mundo
-Vitalidade e saúde
Olhar uma criança brincando é reaprender a dimensão do humano. Quando brinca, a criança está inteira na brincadeira. Ela brinca com todo o seu ser.
Brincar livre
Entretanto, o livre brincar está em declínio na sociedade contemporânea. Infelizmente a Educação Infantil está cada dia mais parecida com o Ensino Fundamental, por causa da ênfase na alfabetização. Atividades que requerem que a criança seja capaz de se sentar em uma mesa e completar uma tarefa usando lápis e papel, que antes estavam restritas às crianças de 5 e 6 anos de idade, são agora dirigidas às crianças ainda mais novas, que não têm habilidades motoras e não têm a capacidade de concentração para isso, com exigências de que devem concluir seus trabalhos e atividades, antes que possam ir brincar. O sistema escolar tradicional tem produzido crianças completamente desinteressadas pela escola.
As consequências da pressão escolar e alfabetização precoce são muito sérias e devemos estar atentos a elas:
1)Desvitalização  do organismo,
2)Empobrecimento da capacidade imaginativa e criativa
3)Apatia, desinteresse pelo mundo
4) Dificuldades  nos relações sociais
5) Agressividade
6)Stress infantil
Sala_de_aula
Crianças que são tolhidas na sua necessidade de brincar terão dificuldades de decodificar o mundo. Stuart Brown, psiquiatra americano, pioneiro na pesquisa sobre o brincar, em seus estudos profundos sobre histórias de vida de assassinos e alcoólatras, descobriu a ausência do brincar na vida dessas pessoas. Seus anos de prática clínica comprovam que brincar bastante na infância gera adultos felizes e bem sucedidos e a capacidade de continuar nutrindo este ser brincante que somos, nos mantém joviais e saudáveis ao longo da vida. Brincar é vital.
Brincar, como disse Albert Einstein, é a forma mais plena de fazer ciência, de explorar e investigar as coisas.
Sei que remar contra a maré é mais difícil, mas neste caso vale a pena. Vale questionar o sistema e defender o direito das crianças viverem a infância como deve ser, com respeito, em sua plenitude, encanto e beleza. Como tão bem versejou Fernando Pessoa,

Quando as crianças brincam
E eu as oiço brincar,
Qualquer coisa em minha alma
Começa a se alegrar.
E toda aquela infância
Que não tive me vem,
Numa onda de alegria
Que não foi de ninguém.
Se quem fui é enigma,
E quem serei visão,
Quem sou ao menos sinta
Isto no coração.

Texto de : Ana Lúcia Machado
Disponível em: http://www.educandotudomuda.com.br/porque-nao-alfabetizei-meus-filhos-antes-dos-7-anos-e-as-06-consequencias-da-alfabetizacao-precoce/

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Nesta semana celebramos a infância!!!

Nesta semana celebramos a infância!!!

Para nós, a data em que a infância deveria ser celebrada é o 20 de Novembro, dia em que foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos da Criança pela Assembleia da Organização das Nações Unidas em 1959. 
A declaração lança princípios para que as crianças ao redor do planeta sejam reconhecidas como seres humanos dignos de proteção e reconhece a criança como sujeito de direito e não como mini-adultos ou propriedade dos pais. 
Quando se entende a criança como sujeito de direitos fica mais fácil compreender que ainda é tempo para deixá-la livre para brincar, e não moldada para comprar ou para satisfazer os desejos de quem quer que for...
Repost do Movimento Infância Livre de Consumismo

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

20 de novembro: dia de celebrar!


Ontem comemoramos um dia muito importante, que deve ser celebrado diariamente: O dia da consciência negra!  Além disso, 20 de Novembro é o mesmo dia em que foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos da Criança pela Assembleia da Organização das Nações Unidas em 1959. 
A declaração lança princípios para que as crianças ao redor do planeta sejam reconhecidas como seres humanos dignos de proteção e reconhece a criança como sujeito de direito e não como mini-adultos ou propriedade dos pais. 
São conquistas resultantes de muita luta! E é preciso constante mobilização para que esses direitos sejam relembrados e nossas crianças tenham o respeito que merecem!

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Infinitas possibilidades!


Depois de um feriado prolongado, nada melhor do que ir retomando às energias e voltando à rotina com um curta que inspira nossa reflexão! Desejamos que todos tenham consciência de suas infinitas possibilidades, e que as diversidades que nos constituem não sejam encaradas como limitações. E que enquanto educadores, possamos favorecer o desenvolvimento das crianças com base em suas potencialidades. É um exercício diário, que pode começar hoje!

sábado, 12 de novembro de 2016

Sanidade Materna



Sanidade materna








Ando preocupada com a sanidade materna. Eu entro nos grupos e, num primeiro minuto, já consigo perceber o tanto de mãe exausta à beira da loucura. Exaustão por passar o dia catando brinquedos o dia todo. Um dos princípios do método montessoriano é a organização do espaço. Uma culpa avassaladora por não conseguir pagar uma escola montessoriana, que custa, no Brasil, por volta de mil reais. Um medo enorme de não colocar o colchão da criança no chão porque, segundo Montessori, TEM QUE ser no chão. Até se você fizer cama compartilhada. Na casa, tem lacraia. A criança precisa ter autonomia. É bom ter um cantinho na sala preparado para a criança com brinquedinho na estante, tapete pra ioga e mesinha (de material natural, por favor). Tudo precisa estar ao alcance da criança. Só que não há espaço em casa pra isso. O banheiro tem que estar adaptado ou o desfralde não vai ser tranquilo: banco, redutor de vaso, estante baixa pra ter tudo ao alcance das mãos. Na cozinha, torre de aprendizagem, mesa baixa, armário baixo com lanchinhos pra favorecer a autonomia e geladeira com comidinhas na porta pra criança conseguir se alimentar sozinha. Ganhar brinquedo de plástico de parente? Não pode. Por que os parentes existem? Eles atrapalham o método perfeito cheio de elementos naturais. Não pode tapete de EVA nem adesivo na parede. Tudo muito colorido. Atrapalha a concentração. Tem que amamentar pra sempre. Até a criança não querer mais e você se sentir péssima, cansada, enjoada, mas disfarçar através de compartilhamento de posts sobre “como amamentar pra sempre faz bem”. E tem que abraçar na hora da birra. Você não pode ter seus sentimentos. Tudo é voltado pra criança. Só ela importa. Você, não. Se usar chupeta ou mamadeira, você é um monstro sem coração que OPTOU por prejudicar a dentição e a respiração do próprio filho. Momento drama: e vai ter que lidar com o trauma do “deschupetamento”. TV? Nunca! Nunca, nunquinha. Invente mil brincadeiras, cozinhe tudo natural, amamente pra sempre, TV desligada, sem chupeta, ambiente organizado e preparado pra criança, não se descontrole, mantenha a calma, dê autonomia pra tudo. E limpe tudo sozinha depois. E fique exausta. E odeie a maternidade. E finja que nada disso tá acontecendo. E poste muitas fofuras no Facebook pra esconder a mãe infeliz que está por trás daquela criança feliz.

Eu não quero métodos que me aprisionam. Educar para a paz e para a liberdade não é seguir uma bíblia com sim’s e não’s. Ter paz e liberdade é fazer o que é possível pra não enlouquecer pra que seus filhos tenham, de fato, uma mãe feliz. Infelizmente, a responsabilidade pelos filhos acaba caindo nas costas da mãe. Por mais participativo que o pai seja, não vejo pais em grupos, páginas, discutindo com os amigos sobre cocôs, vômitos e atividades montessori. Vejo mães preocupando-se com tudo, sozinhas, cansadas. A solidão, a culpa e a busca pela perfeição invadem as casas de tal forma que mulheres-mães estão adoecendo por conta dessa cobrança, por causa de métodos inflexíveis e teorias inalcançáveis.

Eu faço o que posso fazer. Amamentei até 2 anos e eu decidi desmamar. Conduzi o desmame respeitando o meu filho, dando amor e, sobretudo, respeitando os meus limites. Cozinho muito, todo dia, toda hora. Mas, às sextas, canso. Peço pizza. Sim, eu tenho direito de jogar tudo pro alto depois de uma semana cansativa. E você também tem. Tem muita brincadeira, mas também teve TV depois de 2 anos porque eu preciso limpar a casa, fazer comida, tomar um café sossegada. Meus filhos sempre tiveram autonomia em casa. Eles sabem que a casa é deles e tudo aqui é nosso. Dormem em beliche. E tudo bem. É tanta autonomia que o pequeno sobe lá na cama de cima e sabe descer sozinho, rs. Fazer o quê? Ajudar. Ensinar. Comprei o redutor pra vaso. Quem disse que ele quis? Não quis. Nunca usou. Joguei dinheiro no lixo. Senta sozinho no vaso segurando com as próprias mãos. Desfraldou do nada, do dia pra noite. Chupou chupeta com os limites que estabeleci. Um dia a chupeta sumiu de verdade. Avisei que a chupeta tinha sumido. Ficou triste na hora, mas passou. Aceitou melhor que eu. Vai ter dentes tortos? Não sei. Não gostaria que tivesse, mas, se tiver, terei certeza de que fiz o que pude. Preferi que ele tivesse chupeta nos momentos da soneca ao invés de uma mãe enlouquecida. Só aceitei o BLW porque ele não aceitava colher. Suja tudo. Eu sou sozinha aqui durante o dia. Tenho outro filho que chega da escola com fome e precisa de comida no prato. Horrível ter um bebê todo melecado, o chão da sala imundo e outro filho chegando da escola com fome e eu sem saber por onde começar. Temos brinquedos de todos os materiais: naturais e plásticos. Todo presente é bem vindo e, mais importante que brincar com brinquedo de fibra natural, é valorizar um presente dado carinhosamente por alguém que os ama. Meu filho estuda numa escola tradicional, católica, porque é a que cabe no meu bolso, é perto de casa. Não vou submetê-lo ao trânsito caótico da minha cidade pra ter uma educação “diferentona”. Se estou satisfeita com a escola? Não, mas foi o possível. O critério é: tem que ser perto e caber no meu bolso. Prefiro a minha maternidade possível à maternidade idealizada e triste. Meus filhos são importantes, mas eu também sou. Preciso estar saudável pra cuidar deles. Prefiro a honestidade de não seguir nenhum método à risca ao adoecimento causado por “regras” impossíveis.

Mulher, você é maravilhosa. Permita-se não enlouquecer. Permita-se não cair em depressão. Permita-se ser feliz e aproveitar a maternidade enquanto seus filhos estão pequenos. O tempo voa. Quando você menos esperar, eles estarão grandes e não vão mais querer segurar sua mão pra atravessar a rua. Ao invés de catar brinquedo o dia todo, beije seus filhos e refresque sua cabeça tomando um café quentinho olhando pro céu. Ao invés de morrer de culpa, viva a maternidade como você pode, dentro das suas possibilidades. Você não deve explicação a ninguém. Ao invés de seguir qualquer método ou teoria à risca, saiba que tudo precisa ser flexível pra que a gente não perca o pouco de sanidade que nos resta. A vida já é tão cheia de obstáculos… Por que se preocupar com um tapete colorido demais? Eu juro que isso não vai fazer do seu filho uma pessoa menos concentrada. Brinque, beije a barriguinha deles, sinta muito o cheirinho do sovaquinho, “morda” os pezinhos de pãozinho. Nenhuma teoria vai fazer o seu filho mais feliz, mais independente, mais esperto, mais concentrado, mais livre. Não torne a sua maternidade o produto de uma bíblia imutável. Esqueça esse combo que você comprou sem nem ter ideia de que ele tornaria seus dias verdadeiros pesadelos de onde você não consegue fugir. Seu filho só vai aprender a ter autonomia se você tiver. Tome as rédeas! Nenhum grupo de Facebook conhece sua realidade, suas necessidades e seus limites. Criança reflete o que vive. Seja feliz.

Imagem: foto minha, da minha estante. Enquanto eu escrevo, o que é um hobby que amo, ele bagunça tudo. E eu não vou arrumar. Daqui a pouco vou pedir pizza de quatro queijos. Tô vivendo. Vivam também. Sobreviver não é suficiente.

Obs.: Não estou defendendo chupeta, mamadeira, indústria alimentícia, brinquedo de plástico ou TV. Estou defendendo a sanidade materna.

Fonte: Quartinho da Dani.
https://www.facebook.com/quartinhodadany/photos/a.317797454996765.75937.316987148411129/1008921969217640/?type=3

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Quem está na escuta?

É com muita satisfação que apresentamos esse belíssimo projeto do Mapa da infância brasileira, que vem abordar questões extremamente importantes do universo infantil e das possibilidades de uma melhor escuta da voz das crianças em diversos contextos. O material está disponível no próprio site em formato PDF. Vale a pena a leitura para todos aqueles que se dedicam ao cuidado e estudo da criança e da infância! 


Descrição do projeto por Mapa da infância brasileira:

A publicação Quem está na escuta? – Diálogos, reflexões e trocas de especialistas que dão vez e voz às crianças sinaliza caminhos, constrói pontes e abre atalhos para uma temática bastante cara nos dias de hoje: a importância em ouvir, observar e dialogar com o universo da criança. 

Quem está na escuta? será lançado inicialmente em formato virtual, no dia 1º de novembro, na plataforma colaborativa do Mapa da Infância Brasileira (MIB). Reúne artigos de pesquisadores que atuam em diferentes áreas. Quem abre a discussão, numa entrevista exclusiva, é Manuel Jacinto Sarmento, professor em Sociologia da Infância da Universidade do Minho, de Portugal. Ele trata da participação infantil na cidade e da representação da infância nos dias de hoje no texto intitulado Retrato em positivo. Para Sarmento, é urgente estabelecer uma relação recíproca, de fala e de escuta, entre adultos e crianças. 

Assim como Ariadne, a educadora e antropóloga Adriana Friedmann, idealizadora do Mapa da Infância Brasileira, aponta caminhos em A arte de adentrar labirintos infantis. Escutar as crianças, diz a pesquisadora, é como fazer uma viagem ao território da infância. No percurso pelos universos infantis, o viajante descobre diversidade de linguagens, costumes, sabores, cheiros, músicas, danças, brincadeiras, histórias e paisagens. Assim, ao escutar e descobrir o que as crianças têm a dizer, novos mundos e repertórios descortinam-se à frente do adulto. 

Para ouvir as crianças, no entanto, é preciso estar atento à Poética da infância. Nesse artigo, os professores e pesquisadores Severino Antônio e Katia Tavares tratam de uma educação em que as crianças possam pensar, sentir e se expressar poeticamente. Os autores defendem que as crianças, principalmente as pequenas, exercitam espontaneamente um pensamento mitopoético, em que tudo fala, assim como se transforma em tudo.

Em Tessitura de vínculos em campo, os documentaristas David Reeks e Renata Meirelles, coordenadores do projeto Território do Brincar, abordam as relações entre pesquisador e criança em momentos de encontros marcados pelo espontâneo, num banho de rio ou compartilhando brincadeiras. Contam que há uma busca genuína em revelar-se como pessoa, antes mesmo de se mostrar em papéis como pesquisador, educador ou fotógrafo na missão de dar voz às crianças. A “fala” da criança, aliás, extrapola a oralidade. E, assim, os gestos infantis expressam verdades do humano. 

Dos gestos aos olhares. Radiografando uma espécie de etnografia literária e poética, a jornalista e documentarista Gabriela Romeu, uma das idealizadoras do Infâncias, traça perspectivas da observação em Narrativas do olhar (notas de um diário). Com que olho eu olho? Numa multiplicidade do visível, a pesquisadora empresta olhos de diferentes personagens da literatura para experimentar escutar longe e espiar além, provocando deslocamentos e desestabilizando certezas nos processos. 

Os sentidos de ouvir foram também ampliados. A arte-educadora Lindalva Souza, coordenadora do Vozes da Infância Brasileira (VIB), traça rotas diversas para uma escuta lúdica, que incluem criação de mapas, construção de objetos, oficina de desenhos e brincadeiras de faz de conta. Para compartilhar as muitas formas de “ouvir” meninos e meninas de diversas iniciativas de São Paulo, o convite é percorrer o texto Cartografia de uma escuta sensível. 

Mas há ainda mais rotas e caminhos para trilhar: outras experiências de escuta infantil ao longo das páginas são ricas fontes de inspiração. E, para quem ainda tiver fôlego, vale seguir a jornada com referências de livros, sites e filmes que fomentam a discussão. 

A publicação é organizada pelo Mapa da Infância Brasileira, cuja missão é articular, mobilizar e criar sinergias entre os diversos atores e iniciativas voltados para as crianças no Brasil.

sábado, 5 de novembro de 2016

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Como falar de morte com as crianças

A morte é a certeza mais misteriosa da vida. Essa contradição a torna tão difícil de ser compreendida, que dirá explicada às crianças. 
Falar de morte com crianças não é mesmo nada fácil. Como a gente pode tentar explicar uma coisa que não entende e que é tão dolorida? Dá uma tentação louca de que nossos filhos não precisem passar por isso, muito menos quando tão novos. Sim, isso já passou pela cabeça de qualquer um que tenha filhos, mas o melhor mesmo é que seja só um desejo utópico. Uma das coisas que todos os especialistas são unânimes é que, independentemente da idade e da situação – se morreu um bicho de estimação, um parente próximo ou um conhecido distante –, não se deve mentir ou esconder o fato das crianças. “As crianças são só crianças, não bobas”, afirma Maria Helena Franco, psicóloga e coordenadora do Laboratório de Estudos sobre o Luto da PUC-SP.

É difícil dizer o que seu filho entende em cada idade. Mas é certo que, mesmo tão cedo quanto aos dois anos, as crianças são capazes de perceber mudanças no clima e nas emoções da casa. “Se os pais escondem da criança que um cachorro ou peixe do aquário morreu, dizendo que ele fugiu ou sumiu, e depois ela vê o bicho morto, ou mesmo ouve uma conversa sem querer, ocorre a quebra da confiança que ela tem em seus próprios pais”, explica Rita Calegari, psicóloga do hospital São Camilo (SP).

A gente também se engana quando acha que nossos filhos nunca ouviram falar em morte. Ela está nos livros infantis, nos filmes – os pais de Simba morrem em O Rei Leão, os vilões são mortos pelos mocinhos no final –, nas notícias da TV, nas conversas das pessoas na rua. Também está naquele pernilongo que ela vê morto, nas flores que murcham no vaso.

A diferença é que, até por volta dos 6 anos, a criança não entende que a morte é irreversível. “Nessa fase ela não difere fantasia da realidade, acredita que, assim como nos desenhos animados, dá para se levantar depois que cai uma bigorna na sua cabeça”, ensina Julio Peres, psicólogo e autor do livro Trauma e Separação (Ed. Roca). Ele explica que é preciso deixar a criança “brincar de morto”, sem repreender. Isso, somado às pequenas mortes do dia a dia, dos insetos, plantas e pequenos animais, são um bom treino para entender a sequência da vida e facilita na hora de lidar com uma morte de alguém próximo.

Claro que o curso do mundo nem sempre permite essa sequência ideal e que, mesmo com esse “contato prévio”, a hora que a situação vira real, muda tudo. E receita pronta para fazer tudo certo não existe. Depende de quem morreu, de como foi a morte, da proximidade da família e da criança, das crenças de cada um, da personalidade do seu filho. Mas alguns pontos são importantes para se levar em conta:

Na hora de contar

Se for alguém próximo e você estiver sofrendo muito, procure se acalmar primeiro. Use uma linguagem simples que seu filho entenda. Rita aconselha usar o verbo morrer mesmo. Se a pessoa estava muito doente ou tinha muita idade, isso vai responder à famosa pergunta “por quê?”. Já as metáforas que os adultos usam para falar de morte podem não funcionar tão bem, principalmente para as crianças menores de 6 anos. Dizer que o vovô foi viajar, que a tia foi morar com o papai do céu, ou que o primo vai dormir para sempre são conceitos difíceis para os mais novos. Eles ficam imaginando por que o papai do céu não deixa vir visitar, podem ficar com medo de dormir e não acordar mais, ou do pai ir viajar e nunca voltar. Seja simples e espere pelas dúvidas de seu filho. “Temos o hábito de antecipar a angústia da criança pela nossa própria e por vezes damos informações além das que ela precisa e pediu. Dê tempo para ela compreender tudo”, comenta Julio.

Os rituais

A participação infantil nos rituais de velório, enterro, cremação e até mesmo a visita a um parente doente é uma questão muito particular. Há quem pense que nenhuma dessas situações é adequada para crianças, que é melhor guardar apenas memórias dos entes queridos saudáveis e vivos, e há quem acredite que elas podem e devem estar junto, uma maneira de demonstrar que a família se reúne nos momentos felizes e tristes. A decisão vai variar de acordo com os valores de cada família. De novo, o que é importante é avaliar e respeitar os limites e capacidades de seu filho. Se o ambiente estiver carregado de muita emoção, pessoas chorando e demonstrando desespero, como ocorre no caso de mortes violentas ou inesperadas, evite envolver mesmo os mais velhos, até 12 anos. Outro ponto é analisar os seus próprios sentimentos. Você está sob controle? Tem como dar suporte ao seu filho ou algum parente próximo que possa cuidar dele também? Caso a sua decisão for levar as crianças, explique como vai ser antes. Que vai haver uma caixa, a pessoa vai estar deitada lá dentro, mas que não pode ouvir, falar ou se mexer, diga que as pessoas vão estar tristes, chorando, que é um momento de dizer adeus àquela pessoa. Conte até mesmo se terá flores, incensos, música ou velas. Se possível, depois de explicar, deixe a criança decidir se quer ir ou não. Se ela for, esteja pronto para trazê-la de volta para casa se ela não quiser ficar, não espere que ela consiga acompanhar quieta ou séria o tempo todo e entenda se ela falar algo que, no mundo dos adultos, não seria apropriado.

O depois

“O que a criança quer saber é para onde foi a pessoa”, aponta Ceres de Araújo, psicóloga especializada no atendimento infantil (SP). E isso muitas vezes não será resolvido com uma única resposta. Seu filho possivelmente vai perguntar outras vezes sobre onde está a vovó, se ela pode vê-lo, se ela come e toma banho onde está. Para responder, você vai usar as crenças da sua família. Quando não souber o que dizer, seja sincero: diga que não tem a resposta, mas que vai pensar. Se ele perguntar algo diferente do que você acredita, dizendo que viu na TV ou ouviu um amigo falar, diga que o que ocorre depois da morte é mesmo uma coisa misteriosa, que ninguém sabe direito, mas que você acredita desse jeito e outras pessoas, de outro. É uma ótima maneira de exercitar a boa convivência com a diversidade. Nas primeiras semanas, a criança também viverá o luto. Ela pode ficar um pouco mais agressiva, dispersa, com dificuldades para dormir e, no caso dos mais novos, regredir em algo que já havia aprendido, como voltar a fazer xixi na cama. É tudo normal. Não dê bronca nem se preocupe. Em geral, passa logo e você só deve agir se o comportamento ficar muito intenso ou não passar em mais de dois meses.

E o meu luto?

A morte de uma pessoa querida é difícil sempre e quem tem filhos se pega no dilema de como viver a sua própria perda, a sua dor sem que isso seja ruim para as crianças. Não esconda o que está sentindo. Se precisar chorar na frente de seu filho, chore. Isso mostra a ele que não tem problema ele se sentir triste também. E que tudo bem mostrar as emoções. Pois é exatamente isso que prova que estamos vivos.

Por Cíntia Marcucci

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