segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Cuidado! Assim você me machuca!


Cuidado! Assim você me machuca!

Confesso que meu primeiro dia no CMEI foi bem confuso. E agitado. Como é difícil ser a novidade para um grupo de crianças! Deixei o agrupamento com muitas dores e bastante machucada. Era um tal de puxar a tia para lá e para cá, montar na tia, pular na tia, puxar seus cabelos… Um simples “Assim você me machuca!” parecia incompreensível para elas.

Até que, finalmente, percebi. Seus corpinhos também eram arrastados, puxados, carregados o tempo todo sem nenhuma explicação aparente. Um simples “Assim machuca” parece ser incompreensível. Era como se simplesmente não estivessem lá.

Certamente, é bastante comum que nós, como adultos, olhemos para as crianças como o futuro. É como se ainda não existissem, não pensassem e não sentissem. “Elas ainda vão ser, no futuro, quando crescerem…”, pensamos. Por isso, muitas vezes, arrastamos seus corpinhos de um lado para o outro ou falamos coisas que realmente podem ferir e, realmente, ferimos.

É verdade que as crianças são o futuro. Mas elas também são o presente. Elas já entendem muita coisa, se alegram, se entristecem e podem fazer escolhas! A forma como as tratamos vai, de fato, fazer diferença daqui uns anos e no agora também. Assim, já passou da hora de prestarmos atenção nelas, no jeitinho delas de se comunicarem com o mundo.

Será que falar assim pode magoar? Será que segurar desse jeito pode machucar? Qual é ser a real causa desse choro? São algumas, entre muitas, perguntas que não podem deixar de estar presentes enquanto nos relacionamos com as crianças, pequenas ou grandes, para melhorarmos o mundo para elas no futuro e também no presente.

Por Ana Laura Peralta (Licencianda em Psicologia na UFG. Relato de uma experiência no estágio)

 

Entre olhares: é pelo olhar do outro que nós fazemos e refazemos


Entre olhares: é pelo olhar do outro que nós fazemos e refazemos 

Primeiro dia de CMEI, sabia mais ou menos o que esperar, mas a cada minuto ali é sempre uma nova surpresa. Crianças são movimento. Na hora de ir no banheiro, a auxiliar convoca as crianças para uma fila e segue o percurso até o destino final. Observo que fulaninho fica por último na sala e faz questão de fechar a porta, julgo adequado e faço um elogio, seguimos para encontrar o restante da turma. No meio tempo até o banheiro perguntei seu nome e quem até então era carinhosamente chamado de fulaninho, agora mostra-se um sujeito singular: "Me chamo Alberto". 

Quando chegamos ao local, Alberto entra na fila e começa a brincar com os colegas, vez agressivo, vez piadista. A auxiliar me diz "Então você já conheceu o Alberto? Pode ficar tranquila, até o final do dia você lembrará o nome dele". Sorrio sem graça, por que algo naquela ironia me pareceu fora do lugar, me incomoda, mas ainda não sabia dizer de onde vinha o desconforto. Observei. Até o momento foram três dias de observação e percebi que a auxiliar estava correta ao dizer que me lembraria de Alberto, afinal, Alberto é um nome que ecoa boa parte do tempo na sala de aula. “Alberto senta! Alberto não corre! Não Alberto! Não Alberto! Nãããão Alberto! ”. Os olhares, preciosos olhares, olhares esses que vem de figuras de autoridade, ao que me parece, só se voltam para Alberto quando ele se comporta mal. O não pelo não, sem nenhuma explicação do que isso ou aquilo é errado, do “por que não posso deitar no chão, tia?”, “por que não posso brincar de lutinha com meu colega?” ou mesmo “por que não posso escalar a parede para pegar o pano se eu vejo que o homem aranha faz isso?”.

Alberto pelos meus olhos é um menino carinhoso, esperto e muito brincalhão, gosta de arrancar sorrisos e tem uma necessidade de ser visto e reconhecido, como qualquer um que chegar a ler este texto. Hoje entendo de onde vem o incomodo, os olhares se voltam para Alberto somente quando ele está sendo sapeca. E não, Alberto não é sapeca o tempo todo. Alberto é criativo, quer sentar perto da tia e brincar de futebol, adoleta e outras coisas mais. Alberto só atrai o olhar do outro quando está "aprontando".

E se o olharmos quando ele obedecer? E se elogiarmos quando ele se comportar bem? Alberto não é nem de longe só defeitos, como faz parecer o contato dos adultos com ele. Parafraseando Skinner, todo comportamento tende a aumentar de frequência quando é reforçado. A bronca muitas vezes não pune porque ela pode vir mesclada com a atenção, esse tal olhar do outro que constitui. Em outras palavras, a reflexão que pretendo trazer é a seguinte: o aluno problema não é o problema, mas sim como lidamos com ele e a forma que naturalizamos alguns comportamentos nossos. Olhar para o sujeito na sua constituição integral, buscar não patologizar, "Poxa, Alberto é hiperativo", e acima de tudo, o que nós, enquanto cuidadores e professores, podemos fazer para aumentar a frequência de comportamentos positivos de nossas crianças. É um processo de evitar a culpabilização e buscar mais a responsabilidade de entender que na posição de adultos, somos referências e modeladores desses indivíduos. Fazemos parte do ambiente e ele é fundamental na constituição do eu de cada criança.
 
Por Samara Arantes Barbosa (Licencianda em Psicologia na UFG. Relato de uma experiência de estágio) 

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