quarta-feira, 9 de maio de 2018

O “bebê fujão”: um encontro por meio do brincar


Débora Damacena de Andrade*


Em um lugar estranho, à procura de sua figura de apoio, eles choram, fogem, rejeitam a comida, adoecem. Inimaginável é a angústia desse completo desamparo. A experiência no berçário de uma creche me fez entrar em contato direto com a vivência de bebês, que de uma hora para outra precisam adaptar-se a separação de seus cuidadores e permanecer em um universo completamente desconhecido. Um novo ambiente, agora, vai fazer parte do seu modo de existir no mundo e em busca de comunicar-se, eles utilizam-se dos recursos que possuem. Engatinham para fora da sala na busca daquilo que se foi, pelo menos foi esta a reação de um bebê apresentado como “bebê fujão”. Essa foi a forma que ele encontrou de dizer da sua angústia de separação da mãe.
Como lidar com esses sentimentos e emoções expressos por criaturas tão pequenas? A brincadeira apareceu-me como uma resposta possível. O bebê que fugia em determinado momento foi ao encontro do velocípede e em auxílio, coloquei-o no brinquedo e começamos a correr com o brinquedo. Gargalhadas. No decorrer da manhã, o bebê fujão passou a recorrer-se a mim, não mais fugia. Teria ele encontrado uma maneira de lidar com sua angústia?
Essa vivência me fez pensar na brincadeira como meio de interação com bebês no ambiente da creche e como forma de possibilitar-lhes uma forma de ressignificar o sofrimento de separar-se dos pais. Na psicologia, Freud fez referência ao brincar a partir da observação de seu neto brincando com um carretel. Ele percebeu que o jogo de aparecer e desaparecer instaurava a separação, simbolizava um desaparecimento. Era dada, portanto, a representação a uma perda, uma maneira de lidar com a angústia. Melanie Klein, uma psicanalista de crianças, colocou que “O medo de perder a mãe torna doloroso o afastar-se dela, mesmo por certos períodos; e várias formas de brincar dão expressão a essa ansiedade e são um meio de superá-la” (1982, p. 277). Dessa forma, por meio do brincar, o bebê pode elaborar a ausência do outro, suportar a frustração da espera, transformando seu desconforto em um jogo prazeroso relacionado ao outro.

Referências:

KLEIN, M. At all. Os Progressos da Psicanálise. Editora Guanabara. Rio de Janeiro, 1982. Tradução de Álvaro Cabral.

*Debora Damacena de Andrade é graduanda de Psicologia ( UFG) e relata um pouco de sua experiência do Estágio em Licenciatura de Psicologia, sendo realizado em um Centro Municipal de Educação Infantil de Goiânia.
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